Entrevistei Ariano Suassuna na “calçada de casa”

No último dia 23 de julho, fez dez anos da morte de Ariano Suassuna. A data me fez relembrar um dos momentos mais marcantes da minha carreira de jornalista: o dia em que tive o privilégio de entrevistá-lo.

Não lembro a data exatamente e não tem registro, nem em retrato e muito menos em vídeo, já que, na época, mal tinha internet, que dirá celular. O que lembro bem é que eu tava há pouco tempo como repórter de TV, “mais perdida do que cego em tiroteio”. Até que escutei a frase que me fez ter certeza da escolha da profissão que já tô nela há 31 anos (em outubro faz 32):

⁃ Você vai entrevistar Ariano Suassuna!
Como assim? Eu já tinha lido o livro e, depois, visto o filme “O Auto da Compadecida” e, como nordestina e sertaneja, em toda minha vida de consumidora quase compulsiva de arte, até então, nunca tinha me sentido tão contemplada numa obra artística.

Chorava de emoção, ao mesmo tempo em que “morria de rir” pela identificação com o linguajar, as personagens, e toda a trama muito bem humorada, centrada nos maravilhosos João Grilo e Chicó.

Meu Deus, era muito eu! Tudo o que sempre quis fazer: enaltecer a cultura nordestina. E, de certa forma – talvez seja muita pretensão minha dizer isso – o Projeto “Munganga”, que criei há 10 anos (2014), teve séria influência do Movimento Armorial, fundado por Ariano, para realizar uma arte autêntica brasileira baseada nas raízes populares.
Logo que fui informada da entrevista, confesso que fiquei nervosa não, me amostrando. Afinal, ia entrevistar o meu ídolo. Ainda bem que, na hora que fui saindo, alguém da redação me “tranquilizou”:

⁃ Ei, Romye, cuidado que ele não gosta de nomes estrangeiros! Naquele momento, a frase “me tremendo mais do que vara verde” me definiu. Mas, também, tava “mais alegre do que pinto no lixo”.

No caminho da tv até o Espaço Cultural, onde ele participava de um evento, fui pensando em todo tipo de estratégia para abordá-lo e ser persuasiva o bastante pra ele não atentar pro estrangeirismo do meu nome. Pra que danado mainha tinha inventado de botar um nome desse em mim? Tentei puxar de dentro de mim o João Grilo que há em todo nordestino, mas, naquele instante, ele não veio. “Oh promessa sem jeito. Oh promessa desgraçada!”

E o aperreio aumentou quando cheguei lá. De longe, já o avistei, com uma ruma de gente ao redor.

– “Ai meus corim. Gosto tanto deles!”
Até que fui chegando perto e, virada na gota serena, meti de uma lapada só:
– Tudo bem? Vou logo dizendo que, apesar de ser sertaneja da gema, de Pombal, o meu nome é Romye Schneider. A culpa foi de mainha que queria botar os nomes dos filhos tudo diferentes e o meu foi o que ela mais caprichou.

E fiquei esperando a reação… que veio da forma mais Ariano Suassuna de ser:

– “Eu gosto é de gente doida!”
Eita, mulesta! Isso queria dizer que ele tinha gostado de mim, logo de cara? E lá se foi o meu aperreio. E a entrevista fluiu de um jeito fascinante, encantador, inteligente e bem humorada. Igual ao entrevistado e às suas obras. Como se a gente tivesse “fuxicando” na calçada de Taperoá ou de Pombal ou de qualquer outra cidade do nosso sertão nordestino.

Enfim, “só sei que foi assim”: entrevistei Ariano Suassuna na “calçada de casa”.

Eu vivo do jornalismo, desde quando me formei, no início dos anos 90. Até que em 2014 passei a desempenhar mais uma função: a de humorista. Há quem diga que sou uma jornalista engraçada e eu digo que o humor sempre esteve presente na minha vida. Desde criança. Afinal, sou filha de pais bem munganguentos. Aprendi com eles a rir de nós mesmos. Isso ajuda nos momentos mais sérios da vida. Há 10 anos, resolvi “empacotar” esse humor orgânico e botar “à venda” em forma de standup, textos, crônicas, podcasts e criação de conteúdo para o insta: @romyeschneider.

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