A República do marechal Deodoro da Fonseca, civilmente alicerçada em função da Constituição norte-americana, normas pétreas que ainda perduram, originada de uma sociedade colonizadora e elitista, notadamente a do nordeste açucareiro, naturalmente tão intolerante como fora no passado, que não aceitava a convivência pacífica com pessoas de caracteres raciais, psicológicos e culturais africanos. Pelo estado de isolamento a elas imposto, por métodos desumanos promovendo o próprio extermínio. Forçados pelo cerceamento das mínimas liberdades, legítima a resistência, em bloco, pois impossível de fazê-la individualmente. Foi dessa forma que se reuniram em quilombos, o principal deles a do Palmares, compondo uma área que ao tempo de 1630 a 1697 pertencia à capitania de Pernambuco, a serra da Barriga, estado de Alagoas. A sociedade palmeirina chegou alcançar uma população de dez mil fugitivos.
A República de Zumbi dos Palmares confiava o comando dos seus destinos ao líder lendário Zumbi, batizado por Francisco, recebendo esmerada educação, sob os cuidados do padre Antonio Melo. Foge da tranqüilidade desse ambiente para lutar em defesa de seus compatriotas. Sobrinho de Ganga Zamba, dele herdou o suficiente heroísmo, todavia não teve como evitar o massacre contra sua sitiada cidadela, pelos chefes bandeirantes Domingos Jorge Velho, Bernardo Vieira de Melo e Sebastião Dias. Do alto de um penhasco vê a destruição da “Cerca do Macaco”, dali despenca-se, 20 de novembro de 1697, a fim de não ser ferido, mortalmente, por seus algozes.
Séculos mais tarde novo descendente de africana, aflora na figura de um guerrilheiro, Carlos Marighela. Natural de Salvador, (1911), onde cursa o secundário, depois Engenharia, quando participa da ocupação dessa Faculdade (1931), sendo preso. Filia-se ao PCB, por cuja agremiação é eleito Dep. Federal (1947).
O cineasta Wagner Moura relata em filme, há dois anos apresentado no Festival de Cinema de Berlim, que hoje circula pelo País; segundo o ator, dedicado ao “imaginário brasileiro a imagem desse homem importante da nossa história”. Sem dúvida, nacionalista convicto, enveredou pela guerrilha, com um grupo de patriotas, propondo, tal como Zumbi, livrar o Brasil das garras neo-colonialistas. Em 1964, se vale da luta armada, organizando seu quilombo militar, a ALN, que colabora no seqüestro do embaixador dos EUA, Charles Elbrik, no Rio de Janeiro. (1969). Marighela muda-se para S. Paulo, sendo procurado, intensamente, pelos órgãos da repressão. A operação bandeirante, coordenada pelo delegado Sérgio Fleury, que o captura e o assassina, numa das vias centrais paulistas. Zumbi e Marighela entram no pedestal da história.
Jornalista