“Se Jogue!” quer dizer literalmente, é?
“Se jogue!” Ela não entendia o porquê, mas, nos últimos anos, aquela era a frase mais dita pra ela seguir. Acabou gostando do conselho e do conceito e lá se foi tentar segui-los. O ano que tava começando, parecia perfeito pra colocá-los em prática. Decidiu “se jogar”. Entendeu que era literalmente e, por isso mesmo, se lascou.
Ganhou uma semana de folga, a primeira do ano, pra comemorar o aniversário na terra natal, no sertão. Tava que não se agüentava de tanta felicidade. Afinal, ia rever pessoas amadas e voltar à paz que sempre encontrava quando retornava a cidade onde nasceu.
“Se jogue!” A frase, dando o tom, para o novo ano, percorria o corpo dela, de cima a baixo. Literalmente. E era aí onde morava o perigo.
No primeiro dia, comida boa e banho de piscina, mas, para as primas aventureiras não era o suficiente. Inventaram de subir numa pequena serra pra ver o pôr-do-sol. Embora a vontade dela habitasse em continuar no banho de piscina, deu um pinote quando lembrou do novo lema de vida: “Se jogue!”. Precisava fazer algo e seguiu em direção a serra.
Em meio ao caminho, foi se perguntando: “não dá pra ver o pôr-do-sol de dentro da piscina, não, minha gente”? A resposta veio quando deu uma passada maior do que a perna e a hérnia de disco ‘gritou’: volte pra piscina, mulher! Deixe de cavilação! A água é mais macia e oferece menos riscos.
– Mas, logo hoje que eu ia começar a me jogar? A pessoa não tem um minuto de sossego nessa vida.
– Você vai se jogar sim. Só não precisa ser hoje, na véspera do seu aniversário. Corre o risco de ganhar um “presente” nada agradável e ficar toda estropiada.
Seguiu o conselho e voltou pra piscina. A decisão mais acertada. Logo viu que o sol se escondeu atrás nas nuvens.
– Oxe! Se até o sol fica encabulado, em certos dias, imagina eu? Realmente, deve ser um sinal pra eu não me jogar hoje!
A próxima aventura foi no sítio, no dia do aniversário dela. Dia lindo! Tudo muito verde, família unida, rindo, brincando, conversando, fotos, parabéns vai, bolo vem, até alfenim teve por lá. Em meio à festa, a irmã dela sofreu uma queda e lá se foi passar o resto do dia do seu aniversário no hospital.
– Jesus! Me acode aqui! Tô começando a ficar confusa com esse negócio de “Se Jogue”!
No dia seguinte, seria a aventura mais arriscada: subir numa serra bem maior do que a do primeiro dia. Nunca não!
– Pra mim chega! Afinal, ganhei foi mais um ano de vida e não mais uma vida.
Resolveu ficar na cidade, bem tranqüila, sem correr nenhum risco. Chegava daquela coisa de “Se jogue”! Pelo menos, por enquanto. Até que no sábado, à tarde, resolveu dar uma volta na cidade. Não sabia ela que, em poucos instantes, aconteceria o real sentido da expressão “Se Jogue”, literalmente.
Se enfeitou toda pra conhecer um novo café na cidade que ficava ao lado da igreja. E, naquele belo cenário, ‘protegido por Deus’, foi aventurar-se em algo que não correria riscos. Jamais! Bem diferente de subir a serra. Era óbvio!
De forma bastante infantil, podemos dizer, sentou num balanço pra tirar foto e, naquele momento, nunca a frase “Se jogue” fez tanto sentido. Escorregou pra trás, passou direto do balanço e se estabacou no chão, com todo corpo que Deus lhe deu. Até sentiu a cabeça tilintar e a lombar se apavorar. Embora tenha ficado toda dolorida, por sorte, não houve nada grave. Só a certeza que teve ao se levantar daquele momento infeliz:
– Pra mim chega dessa coisa de “Se jogue”. A não ser que eu passe a entender de outro jeito, porque da forma literal, só me lasquei! Vôte!