A latência começou a impregnar-se na cabeça dos generais de pijama, partidários da linha dura, desde a firme decisão do pres. João Figueiredo em favor da redemocratização do país. Não se conformavam pela abertura, gradual e segura, defendida por Ernesto Geisel. Gostariam de prosseguir convivendo com a restrição das liberdades, torturas e mortes. Alimentavam, contudo, a esperança de uma volta por cima. Dependiam deles próprios, da inteligência de cada um, das articulações, inclusive com personagens civis, como eles, da corrente filosófica maquiavélica e fascista. Tudo seria possível, uma questão de tempo.
Pacientes, visionários como o ministro Ricardo Salles, deixavam a boiada passar, ou como a sua colega da Agricultura, Tereza Cristina, o boi-bombeiro, para justificar as queimadas no Pantanal, suportavam, institucionalmente contidos, as efêmeras lideranças democráticas e populares, no comando da nação, após os governos de transição de José Sarney, e conservador de FHC. Apostavam, mais tarde, na figura caricata e patética de um desconhecido deputado federal, do PP/RJ, messiânica no nome, Jair Bolsonaro. Suas declarações e de polêmico comportamento parlamentar, encaixavam-se nas pretensões do grupo de militares revanchistas. Além do mais detinha uma qualidade que lhe fazia diferença: homofóbica. Certa feita, ao ser abordado pela artista Preta Gil, que indagou de sua reação, acaso um de seus filhos tivesse relações amorosas com uma mulher negra. Prontamente, respondeu: “Não corro a esse risco, pois eles não foram educados em ambiente como seu!”
Virou, de verdade, na lídima tradução de uma direita raivosa, hoje sabidamente triunfante. O projeto de desmonte nacional, em todas as direções, é uma realidade. A começar por uma política externa dependente, a torração do solo pátrio, conforme a intensificação das queimadas; o descaso para com a Covid-19; a intolerância às liberdades de expressão, somam-se a uma série de desastres administrativos, cometidos por uma assessoria ministerial (respeitadas as exceções) de incompatível categoria, que não condiz com os anseios da população. As perseguições à atleta Carol Solberg e à Marina da Silva, num espaço de dois dias, e as constantes desatenções aos profissionais da imprensa, não acontecem isoladamente, têm conexão com dois outros Poderes, imprimindo um desalinhamento institucional sem precedentes. Noticiar corrupção, quando se tratar do clã presidencial, está vedada pela Justiça, que lembra o enquadramento do jorn. Claudio Campos, na LSN, à época da ditadura, por semelhante motivo, pois envolvia empresários, políticos e militares de patentes superiores, depositantes de bancos suíços.
Jornalista